No Norte do Brasil, mudanças nos ciclos de cheia e seca dos rios aumentam exigências logísticas para levar atendimentos a comunidades

918Temperaturas em alta, aumento das secas, tempestades mais severas: as consequências das mudanças climáticas têm gerado danos diversos à população nas diferentes regiões do Brasil - e do mundo. Esses eventos têm afetado, também, a Justiça do Trabalho, que registra impactos à prestação de serviços para a sociedade em razão dos efeitos dessas transformações.

Nesta semana, a série “Trabalho e Clima - Justiça do Trabalho e COP30” detalha alguns desses prejuízos, com relatos que vêm de diferentes regiões do Brasil. A primeira reportagem trata da Região Norte.

O conteúdo foi produzido pelas equipes de comunicação de Tribunais Regionais do Trabalho, em parceria com o Tribunal Superior do Trabalho.

“Nossas estradas são os rios”

No Norte do Brasil, as grandes extensões territoriais e o isolamento geográfico de comunidades sempre representaram um desafio para viabilizar o acesso das populações à Justiça. Para contornar a dificuldade, foi desenvolvido o projeto Justiça Itinerante, em que magistrados e servidores vão a localidades em que não há Varas do Trabalho para prestar atendimento e garantir direitos.

Grande parte dos deslocamentos depende de barcos, e o calendário é adaptado ao ciclo natural dos rios, que influencia diretamente a logística das ações. Esse ciclo é composto por duas fases: a enchente, entre dezembro e maio, quando os rios sobem gradualmente; e a vazante, entre junho e novembro, quando as águas começam a baixar.

Mas as equipes da Justiça do Trabalho nos estados do Norte do Brasil estão se deparando com desafios crescentes para essa atividade, em razão da alteração nesses ciclos, com agravamento de secas e, também, chuvas mais intensas e alagamentos.

 

"As comunidades se desenvolvem

ao longo das calhas e margens. Quando a seca é intensa,

alguns locais ficam desconectados dos rios."

 

No Estado do Amazonas, por exemplo, entre 2023 e 2024, duas estiagens críticas afetaram todos os 62 municípios. Segundo a Defesa Civil do estado, mais de 800 mil pessoas foram impactadas em 2024, o que corresponde a cerca de 190 mil famílias.

As consequências do problema incluem a queda drástica dos níveis dos rios e o surgimento de bancos de areia, que afastam embarcações e comprometem a navegação. “Nossas estradas são os rios, e as comunidades se desenvolvem ao longo das calhas e margens. Quando a seca é intensa, alguns locais ficam desconectados dos rios, impossibilitando o transporte e o recebimento de insumos básicos como alimentos e água”, explica o juiz do trabalho André Luiz Marques Cunha Júnior, lotado na Vara do Trabalho de Parintins (AM).

Isso significa que o deslocamento dos servidores da Justiça do Trabalho e o acesso dos moradores das comunidades mais remotas aos pontos de atendimento fica mais difícil.

Imprevisibilidade dos ciclos afeta planejamento

O diretor da Vara do Trabalho de Parintins, José Aldo Pascoal Viana Neto, acrescenta que, com as mudanças climáticas, os ciclos de cheia e estiagem dos rios amazônicos estão cada vez mais imprevisíveis, o que afeta todo o planejamento dessa operação da Justiça. “A Justiça Itinerante, idealizada para superar barreiras geográficas e levar serviços essenciais a comunidades interioranas, tem sua operacionalidade intrinsecamente ligada aos extremos climáticos da região”, afirma.

 

Situação semelhante é enfrentada em Coari, também no Amazonas, como relata a diretora da Vara do Trabalho local, Rai Letícia. Ela explica que o município de Codajás, sob a jurisdição da Vara, sofre com alagamentos severos nas grandes cheias e com dificuldades de acesso durante as estiagens, quando os barrancos dificultam a subida até a cidade. “Nas grandes cheias, a cidade fica totalmente alagada. Já nas secas, o problema maior é o desembarque, que fica longe, e os barrancos que precisamos subir até chegar na cidade”, lembra.

Outro exemplo vem do Amapá: no final do ano passado, uma equipe de 11 servidores do TRT-8 (PA/AP), liderada pelo juiz do trabalho José Eduardo, enfrentou uma jornada desafiadora para chegar às aldeias Kumarumã e Kumenê, na Terra Indígena Uaçá, no Município de Oiapoque, em razão da seca. “Tivemos que nos deslocar por um ramal de difícil acesso e aguardar uma retroescavadeira terminar o serviço para conseguirmos passar”, relata. “Depois, o deslocamento foi feito de barco, entre aldeias, o que levou quase quatro horas de viagem.”

Adaptação é essencial

Os desafios, contudo, não intimidam quem atua na Justiça Itinerante. Em Kumarumã, a equipe realizou audiências e orientações jurídicas, garantindo que os direitos dos trabalhadores indígenas fossem respeitados. Já em Kumenê, a alta demanda levou à realização de atendimentos em dias consecutivos, com o apoio da comunidade local.

A experiência evidencia a urgência de políticas públicas que considerem os efeitos das mudanças climáticas sobre a infraestrutura e os serviços públicos na Amazônia. Para a Justiça do Trabalho, adaptar-se a esse novo cenário é essencial para manter sua presença ativa e eficaz nas regiões mais distantes, onde o acesso à justiça ainda é um desafio diário.

 

 

Coordenadoria de Comunicação Social
Texto: Jonathan Ferreira/TRT-11 (AM/RR) e Danielly Silva/TRT-8 (PA/AP)
Edição: Natália Pianegonda e Carmem Feijjó (TST)
Vídeo: TRT-11 (AM/RR)
Fotos: Divulgação TRT-11 (AM/RR)

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