Pesquisas mostram que o grupo enfrenta as maiores taxas de desemprego, informalidade e discriminação no mercado de trabalho brasileiro

950No Brasil, o mercado de trabalho segue refletindo profundas desigualdades raciais e de gênero. Conforme apontam pesquisas, mulheres negras, pardas ou pretas enfrentam o que os especialistas chamam de “desigualdade dentro da desigualdade”: além das barreiras impostas pelo machismo, lidam com o racismo estrutural, um sistema de exclusão que se perpetua por meio de práticas institucionais e sociais. Ao contrário do que muitos acreditam, os dados mostram que, mesmo com formação acadêmica e qualificação profissional, essas mulheres continuam sendo alvo de preconceito e enfrentam obstáculos para acessar empregos formais, alcançar cargos de liderança e obter remuneração justa.

Complementando esse cenário de desigualdade, os dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) revelam que as mulheres negras seguem sendo o grupo mais vulnerável no mercado de trabalho brasileiro. Em 2022, apenas 52% delas participavam da força de trabalho, e 25,3% estavam em situação de informalidade, condição que compromete o acesso a direitos como previdência, estabilidade e proteção social. A taxa de subutilização, que engloba desemprego, subocupação e desalento, atingia 30,4%, a mais elevada entre todos os grupos analisados.

Já os dados da Relação Anual de Informações Sociais (RAIS) do 2º trimestre de 2024, divulgados pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), reforçam esse quadro de exclusão. O Brasil registrava 7,5 milhões de pessoas desocupadas, com uma taxa média de desemprego de 6,9%. No entanto, ao observar o recorte de raça e gênero, a desigualdade se acentua: a taxa de desemprego entre mulheres negras era de 10,1%, mais que o dobro da registrada entre homens não negros (4,6%).

A disparidade se reflete também na ocupação das funções mais precarizadas da economia. Segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD) do IBGE, em 2023, 91% das trabalhadoras domésticas no Brasil eram mulheres, e 67% delas eram negras. Como destacou Paula Montagner, subsecretária de Estatística e Estudos do Trabalho do MTE, “as mulheres negras estão concentradas nas ocupações localizadas na base da pirâmide do mercado de trabalho, atuando principalmente em serviços domésticos, de limpeza e alimentação. Elas ainda ocupam as vagas com as menores remunerações salariais”.

Casos de racismo no trabalho

A pesquisa “Mulheres negras no mercado de trabalho”, realizada pela consultoria Trilhas de Impacto, revelou que 86% das mulheres negras já sofreram racismo no ambiente profissional, mesmo estando formalmente empregadas e com alta qualificação. Entre as 155 participantes, todas com ensino superior completo, 50,3% possuem pós-graduação ou especialização, 13,5% têm mestrado ou doutorado, e 24,5% concluíram a graduação. As situações relatadas vão desde microagressões, como comentários sobre o cabelo ou com funções de limpeza, até exclusão de oportunidades, como estagnação na carreira, disparidade salarial e barreiras em processos seletivos presenciais.

Outro dado é que 68% das profissionais foram confundidas com funcionárias da limpeza, mesmo atuando em cargos técnicos ou de gestão. Também foram registrados casos recorrentes de desigualdade salarial, em que empresas criavam cargos fictícios para justificar remunerações superiores a colegas brancos que exerciam funções semelhantes.

Para a juíza do Trabalho Larissa Carril, coordenadora do Comitê de Incentivo à Participação Feminina do TRT-11, as manifestações de racismo recreativo incluem piadas, imitações, apelidos e outros comportamentos que banalizam a experiência de discriminação e desumanizam indivíduos com base em suas características raciais. “Essas ações são frequentemente minimizadas ou justificadas como inofensivas por serem rotuladas como “brincadeiras”. A discriminação racial no mercado de trabalho brasileiro é um reflexo direto do racismo estrutural e institucional que permeia a sociedade”, destaca.

A magistrada orienta o que fazer em casos de assédio no ambiente de trabalho: “a trabalhadora pode registrar reclamação nos canais internos (RH, compliance, ouvidorias), buscar entidades sindicais que auxiliam na instrução probatória, acolhimento e negociação com a empresa; além de ingressar diretamente com ação judicial contra a empresa e também. Também é possível acionar Ministério Público do Trabalho (MPT) e formular denúncias no Ministério do Trabalho e Emprego”.

Combate na Justiça do Trabalho

Para combater o racismo e o sexismo no ambiente profissional, a Justiça do Trabalho tem fortalecido o compromisso por meio do Protocolo para atuação e julgamento com perspectiva antidiscriminatória, interseccional e inclusiva, lançado pelo Tribunal Superior do Trabalho (TST) e pelo Conselho Superior da Justiça do Trabalho (CSJT). O documento orienta magistrados a considerar, em decisões, as múltiplas formas de discriminação que afetam trabalhadores e trabalhadoras, com atenção especial às mulheres negras, que enfrentam simultaneamente o racismo e o sexismo nas relações laborais.

A proposta do protocolo é garantir julgamentos mais justos e sensíveis às desigualdades estruturais, promovendo a igualdade real no mundo do trabalho. Ao reconhecer que as discriminações não ocorrem de forma isolada, mas se sobrepõem e se intensificam, o documento contribui para uma atuação judicial mais comprometida com os direitos humanos, a inclusão e a reparação histórica. Trata-se de um avanço importante na construção de um sistema de justiça que enxerga e enfrenta as complexidades das opressões vividas por grupos vulnerabilizados.

Para o presidente do TRT-11, desembargador Jorge Alvaro Marques Guedes, o enfrentamento ao racismo e ao sexismo no trabalho exige formação contínua e atuação sensível às desigualdades estruturais. “A Justiça do Trabalho tem incorporado, de forma progressiva, os Protocolos para Julgamento com Perspectiva Racial e de Gênero, fortalecendo decisões mais justas e alinhadas aos direitos humanos. Esses instrumentos aprimoram a análise das provas e ajudam a evitar abordagens que desconsiderem a realidade das discriminações que afetam, de maneira ainda mais intensa, as mulheres negras.”

Ele reforça que a construção de ambientes de trabalho seguros e inclusivos depende de responsabilidade compartilhada. “Instituições e empresas precisam adotar políticas efetivas de equidade, promover educação permanente e assumir uma liderança comprometida com a prevenção de discriminações e violências.”

Denúncias

Antes de formalizar uma denúncia de racismo, sexismo ou outras irregularidades no ambiente de trabalho, é essencial reunir provas que sustentem a acusação. Mensagens, vídeos, gravações, registros de datas e nomes de testemunhas são fundamentais para garantir a materialidade dos fatos e facilitar a apuração da conduta. Caso o episódio tenha ocorrido na presença de outras pessoas, é importante identificá-las, pois poderão ser ouvidas durante a investigação.

Existem diversos canais oficiais para registrar denúncias. A plataforma FalaBR (http://falabr.cgu.gov.br) permite o envio de denúncias aos órgãos do Poder Executivo Federal, além de estados e municípios que utilizam o sistema como ferramenta de ouvidoria. Irregularidades trabalhistas, como assédio e discriminação, podem ser denunciadas pelo site https://denuncia.sit.trabalho.gov.br/home, mediante identificação via Gov.br.

Também é possível registrar a denúncia diretamente no portal do Ministério Público do Trabalho (MPT), acessível em https://www.prt11.mpt.mp.br/servicos/denuncias. Além desses meios, a vítima pode buscar apoio na Superintendência Regional do Trabalho, na Defensoria Pública, em sindicatos ou associações profissionais. Em casos de violência contra mulheres, o telefone 180, da Central de Atendimento à Mulher, oferece suporte especializado e orientação.

A temática também está sendo abordada ao longo da campanha 21 Dias de Ativismo pelo Fim da Violência contra a Mulher, promovida pelos Comitês de Incentivo à Participação Feminina, do Trabalho Seguro e de Equidade, com apoio da Escola Judicial e de universidades parceiras.

 

Coordenadoria de Comunicação Social
Texto: Jonathan Ferreira
Foto: Banco de imagem

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